04 maio 2011

FILME "LARANJA MECÂNICA" (1971)


A estória é em torno de Alex (Malcolm McDowell, o eterno “Calígula”), líder de uma gangue de delinquentes que, como fonte de satisfação, no que eles chamam de “ultraviolência”, matam, roubam e estupram. Mais tarde, Alex cai nas mãos da Polícia e é usado em um experimental e desumano método que visa refrear seus maléficos impulsos. Ao final, Alex, agora em um ser extremamente impotente, retorna indefeso à sociedade.

O estranho título, "Laranja Mecânica”, tem no mínimo significados – isso mesmo, significados – curiosos, tão incomuns quanto o próprio título.
Ao pé da letra, o título original, “Clockwork Orange”, quer dizer “Laranja com Mecanismo de Relógio”. O que nos remonta a uma visão mecânica, forçada e robótica da qual se pode condicionar o comportamento humano.
Quanto ao substantivo frutífero “laranja”, pesquisei sobre e, aqui, propriamente dito, tem semelhança com a palavra inglesa “orang – utan”, ou seja, indireta a uma conhecida espécie de macaco (Orangotango), certamente alaranjado, fácil de dominar.
Ainda em relação ao título, existe também a alusão ligando-o a uma velha expressão londrina (o filme se passa em Londres) que apropriadamente significa: “muito estranho”. Nesse aspecto, liga-se à visão do autor sobre o comportamento dos jovens delinqüentes ou, mais corretamente, como já se apontou no início, ao tratamento que o criminoso Alex fora submetido.
A ideia que prevalece então é que o título abrange todo o procedimento supramencionadamente mecânico e artificial em que Alex é inserido sob o subterfúgio de “reabilitação”, por qualificarem o ser humano como um ser programável; um verdadeiro animal “domesticável”.

Sem dúvida, o grande trunfo do filme, muito polemizado na época – até mesmo proibido de ser exibido no Brasil –, foi apresentar a violência de forma tão aberta e ampla, abusando totalmente da complexidade do tema, em uma chocante e irônica narrativa.
No tocante ao personagem Alex, pode-se dizer que as barbaridades antes fomentadas e praticadas por ele, subjugadas como sem razão, são, na verdade, uma represália contra esse mesmo governo, corrompido, regido por paradigmas egoístas, motivado unicamente pelo interesse e benefício próprio.
Independente de como ele se portasse, agora “civilizada”, ou antes, desordeiramente, ele sempre seria a repressiva vítima.
Por tal motivo, Alex poderia ser incontestavelmente o herói da estória, mas ao analisar toda a monstruosidade cometida por ele contra inocentes [ou não... tanto faz], mesmo sendo fruto de sua considerável revolta, a exata justificativa de seus atos não aparece. Sendo assim, nessa retratação, mocinho e antagonista se contrasta.
Kubrick, satisfatoriamente, não isenta ninguém, ele simplesmente explora os dois lados, revelando intrinsecamente cada intenção, para que o expectador chegue a um veredito, segundo o que lhe apraz.

Em equiparação com a nossa realidade, “Laranja mecânica”, nos faz perceber que, pela má e controladora atuação do Estado como regente da ordem, a sociedade se torna apática no que diz respeito aos infortúnios com as quais se depara como, impunidade, desrespeito, preconceito, corrupção, guerras, assassinatos. Isso porque a indiferença foi bem imputada pela subordinação. O que é muito bem representado na cena final em que o vilão/herói Alex, “regenerado”, tem o seu silêncio obrigatoriamente comprado.
E é isso que o roteiro basicamente denuncia: A violência é notavelmente aflorada quando somos duramente inibidos por pseudolálicos e invasivos concebimentos morais, cotidianamente sustentados pela hipocrisia e conivência, seja governamental, religiosa ou meramente social. Pois a prática da violência, em tese domada pelo conceito civil, nos é inerente e instintiva. No entanto, o que mais ocorre em nosso meio é a rendição voluntária à inatividade, por ser assim mais cômodo.

Os agentes controladores do filme, governo e igreja, tanto um como o outro podem [e por vezes o fazem] manipular em prol de seus ideais. Um agente utiliza-se de argumentos inspirados no que denominam como “boa conduta”; o outro se apega àquilo que julga ser aprovado ou não por Deus. Então, o que fosse considerado “politicamente incorreto”, ou “heresia”, tinha como resultado a punição.
É, talvez Stanley Kubrick estivesse suscitando repúdio a política e a religião, talvez não, pois, pelo que conheço de seus filmes, mesmo polêmicos e “rebeldes”, são abertos à interpretação pessoal. Baseado nisso, a mensagem que eu extraio como espectador, simplória ou equivocada que seja, é acima de tudo, um alerta no que diz respeito às nossas atitudes tomadas, decisões pessoais e/ou qualquer manifestação que venhamos expressar.
Segundo meu ponto de vista, ao contrário do que alguns pensam sobre o filme conforme pesquisei, acho descartável a ideia de que a obra apoie à anarquia ou, redundamente, a total abdicação de lei, fé e ordem.
Aceitar assim é generalizar, e isso pode soar como insensato no tocante ao contexto, ainda mais se o motivo for baseado na leviandade de alguns. Eu prefiro ressaltar que o problema não está nos agentes em si, e sim na deturpação que eles sofrem ao serem direcionados por pessoas más intencionadas.

Muitos concordarão que, quando se trata de opinião, dificilmente encontramos algo absoluto ou infalível. E com o diretor Kubrick não é diferente. Ele também é passível de refute, erros e relatividade como qualquer um, porém, admito que é irrevogável sua coerência à frente de "Laranja mecânica".
Parece contraditório, mas não, a discussão levantada pela trama vai além do que possamos compreender. Qualquer impressão é inteiramente pálida, diante de tudo o que mostrado nesta película.
Fato: sempre fomos condicionados a algum tipo de controle abusivo, e hoje esse campo foi ampliado e mascarado, sendo intermediado por mídias, por sociedades alternativas, facções, grupos, e etc, que nos impõe conceitos, doutrinas e diretrizes, na tentativa de nos privar de pensar e agir naturalmente.
Portanto, se aprendi algo com este filme foi que devemos ser autênticos no que somos e convictos do que queremos.

Uma última observação pertinente a se fazer é que “Laranja mecânica” não é um exemplar prazeroso de se ver. Estou falando de um clássico cult, forte, único e duramente confrontador. Confesso que fiquei impressionado quando o assisti.
Entretanto, é importante reconhecer a importância do mesmo para a sétima arte, e sua genialidade em abordar tal assunto, com tamanha presteza. Ainda mais ao ver que esse é um dos poucos filmes em que sexo e violência não são meros artifícios de apelação visual. Cada cena tem, necessariamente, um objetivo por de trás, seja implícita ou explicitamente. Por isso é que Kubrick, revolucionário e original como era, conseguiu criar uma obra visionária e indelével para história!
Sem mais, afirmo: “Laranja mecânica” não é o melhor do entretenimento; “laranja mecânica” é um duro exemplar da mais intimista arte cinematográfica...



03 maio 2011

FILME "O RITUAL" (2011)

Eu hesitei em escrever sobre “O ritual” logo que o assisti porque entendo a decepção que o mesmo gerou no público - vou explicar o motivo logo mais. Inclusive, concordo com as negativas críticas que este recebeu, mas achei necessário repensar sobre redigir ou não uma opinião sobre ele já que Anthony Hopkins está presente, e maravilhosamente bem.

Quando se fala em “exorcismo” é inevitável não se reportar ao clássico “O exorcista” protagonizado por Linda Blair em 73, e todo aquele vômito verde, cabeça girando, cama trepidando e etc. Surgiram também alguns herdeiros interessantes como “O exorcismo de Emily Rose”, “O último exorcismo”, tão assustadores e peculiares quanto o precursor da ideia.
Devido a isso, “O ritual” não foi tão bem recebido, principalmente pelos americanos, pois ao abordar uma temática tão bem representada e variadamente explorada, o mínimo que se esperava eram muitos sustos e sangue, afinal, sempre que aparece um filme de proposta derivada espera-se que este tente superar, ou maximizar as possibilidades do tema. Mas não foi o que ocorreu.

Acredito que “O ritual” seja o filme mais honesto no assunto, pois ele opta por mostrar o lado oposto do que já foi visto, voltando-se aos rituais em si, como o próprio título indica.
No filme, este que é baseado num livro não-fictício, revela que os tais exorcismos ainda são praticados pela Igreja Católica, com autorização e respaldo da mesma, só que por um grupo seleto e bem reduzido, isso nos EUA. Portanto, o filme tenta perambular pelo lado crível e austero da coisa, se comparado aos outros filmes que abordam o tema em questão. Mas já adianto, o “chá de cadeira” é certo, os sustos são previsíveis e mínimos, sem contar que os primeiros minutos são uns martírios de chatos, e a estória só engrena quando Hopkins aparece, o que demora um bocado.

Em relação ao grande astro, ele está magnífico aqui. Enfático, preciso, compenetrado e muito convincente, como não se via há algum tempo. E ainda consegue introduzir certo humor ao personagem, o que não prejudica sua composição; atributos que só um “velho de guerra” consegue com tanta eficácia.
É também percebido que Hannibal Lecter, seu antológico e pronunciado personagem, foi uma inspiração aqui, para não dizer uma voluntária reminiscência, talvez por este motivo ele próprio tenha sido só elogios para com este filme.

Mas o personagem central, na verdade, é o sonolento Colin O´Donughue, importado da série “The Tudors”. Ele aqui é um jovem cético e humilde que, em busca de uma educação de qualidade, parte para o seminário. Dificuldades à parte, ele é mandado para a Itália, para estudar em uma escola especializada em exorcismos. Lá ele é encaminhado para uma pequena aldeia em que se concentram os casos mais recorrentes de possessões demoníacas.
Como sempre, a figura endemoniada é uma figura feminina, sob a posse de mais um espírito resistente e extremamente desafiador. Mas ao contrário de todos os exorcismos já vistos no cinema, como já sobredito, tudo aqui é muito “tranquilo”. Até mesmo “Constantine” de Keanu Reeves é mais assustador no que concerne às esconjurações.

O filme conta também com a notável participação de Alice Braga (“Predadores”). Ela, com certeza, a brasileira mais presente em longas ianques, com papéis significativos até, tem seu considerável esforço comprovado aqui.
Alice não fica devendo em nada e mostra aptidão no que faz. E isso não é simpatia pátria [somente], é o reconhecimento de um talento nosso em ascensão em um meio tão hermético como Hollywood.

Continuando no que diz respeito ao roteiro, não levando em conta algumas incoerências contextuais, o grande furo do filme mesmo é partir para uma linha investigativa, acentuando a dramaticidade da situação e esquecendo de aguçar o necessário medo no espectador, afinal, é isso que normalmente os filmes de horror proporcionam.
O público que é atraído por essa espécie de entretenimento, ainda mais se tratando de algo que envolva manifestações demoníacas, espera que o pavor seja aflorado no decorrer da projeção, não obstante, em “O ritual” tudo isso é, erroneamente, deixado em segundo plano, perdendo a chance de ser mais um expressivo integrante do time das possessões. Ainda mais tendo Hopkins no casting, abrilhantando a película.
Por fim, é mais que compreensível às críticas negativas que recebeu o filme em terras do "Tio Sam". Os fãs não polpam filmes, aparentemente proeminentes para o gênero, sendo desperdiçados assim. Contudo, que fique claro, o filme não é de todo ruim, só não é o que se espera.



FILME "IRREVERSÍVEL" (2002)

O diretor argentino Gaspar Noe conseguiu gerar com esta altercada obra, denominada como “Irreversível”, múltiplos sentimentos em seus espectadores, em suma, negativos. Com o decorrer de minha resenha, vou esclarecer o porquê...
Acredito que a maioria das pessoas que resolveram ver “Irreversível”, foi motivada a fazê-lo devido a sua famigerada cena de estupro, pois filmes que abordam tal temática costumam causar essa curiosidade suspeita, e comigo não foi diferente, apesar de o tema me incomodar bastante.

Quanto ao roteiro, este é basicamente sobre um homem que busca implacavelmente o estuprador de sua namorada. Uma premissa consideravelmente fraca, entretanto com alguns diferenciais, dentre eles o ímpeto irracional do tal homem ao tentar encontrar o algoz, os lugares escabrosos pelos quais ele percorre, e o estupro propriamente dito.

Outro diferencial que poderia se destacar na estória é que a mesma é contada de trás pra frente, mas como tal recurso já foi utilizado em alguns filmes – como bom exemplo, “Amnésia” de Christopher Nolan –, não se vê nisso novidade. Aliás, esse detalhe até aborrece um pouco porque só vamos entender o que está acontecendo lá pela metade do filme, conforme retrocede a trama.
Devido a isso, o início é extremamente confuso, sombrio, contando ainda com um abusivo filtro vermelho na fotografia. Mas o que torna tudo ainda mais conturbado é a câmera que gira por vários ângulos freneticamente.
Como o final do filme é o começo, o diretor tenta aliviar toda a barbaridade do início com um belo e romantizado “final”, mas essa artimanha não funciona por se saber que o desfecho é totalmente contrário e aterrador, mesmo que mostrado antecipadamente.
Como o próprio título sugere, qualquer tentativa de amenizar o impacto inicial seria em vão, já que o tal ocorrido é “irreversível”.

Monica Belluci, sempre linda, está impecável na pele de vítima. Como já citado, a cena do estupro é angustiante, e acredito que seja a mais real e perturbadora já feita até então. O que se deve em grande parte ao brilhantismo da bela em transmitir todo o desespero do momento.
Pra se ter uma idéia, a cena tem aproximadamente 10 minutos, sem corte, com a câmera posicionada em um mesmo e “privilegiado” ângulo. Não é à toa que uma multidão abandonou a sala de exibição no Festival de Cannes em 2002, quando o filme chegou nesta parte.
E é difícil de assistir mesmo. A personagem além de ser submetida ao sexo forçado, como conclusão de toda a brutalidade, é ainda afligida à violência física, expressada da pior forma possível, com direito a socos e chute, fazendo com que insurja revolta e indignação em quem assiste.
O mais triste é que, o estupro é um dissimulado fetiche em nossa sociedade, fato preocupante e mais do que desvirtuado, e como a cena é estendida, o espectador ainda corre o risco de achar doentiamente excitante toda aquela violência sexual, o que torna o episódio ainda mais controverso.

Na verdade, a primeira impressão que eu tive ao tentar refletir sobre o filme é que Gaspar queria chocar e criar alvoroço, nada mais. Isso porque ele provoca o público com situações nauseantes e deliberadamente cruéis. Vi-me acuado com a descabida - porém realista - violência demonstrada. Destaque também para uma fortíssima cena em que um homem tem seu rosto destroçado por meio de um extintor de incêndio.
Então, questionei inicialmente se seria essa a razão de “Irreversível”, mostrar sem pudor a imundície da natureza humana que estupra, agride, mata, friamente, sem relevar as implicações de tais atos... Realmente não me decidi. Mas se for só isso, pensei “é justificável a idealização do diretor em optar por uma retratação tão empedernida?” Também não sei... Na verdade, as especulações ficam abertas à subjetividade.

Agora, se o filme tem alguma qualidade a ser ressaltada, é a ambiguidade do ser humano, muita bem delineada aqui, quando nos é apresentado um namorado romântico e pacato, que se transforma em um descontrolado, capaz de tudo para se vingar, impulsionado pela desgraça que lhe foi envolta.
Conforme adiantei, se vê que “Irreversível” não é um filme de massa, muito menos de proposta afeita. Vê-lo é realmente uma experiência crua, desgastante, intimidadora, intensa, espúria... e por aí vai.

Mas, pra concluir, ouso dizer que “Irreversível” não é um filme totalmente dispensável. Assisti-lo será uma tarefa complicada, mas se você optar por ver, faça, nem que seja somente para criar aversão no que diz respeito à pessoa do diretor e sua ideia subversiva de elaborar algo tão crível, sujo e traumático como é esta película.
O cinema precisa, relativamente, de momentos polêmicos e dissociativos como esse, para que a sétima arte se torne ainda mais epopéica. Mas que sejam momentos eventuais, pois se isso se torna recorrente, eu tenho medo das mentes fracas que veem filmes assim como inspiração para a maldade...
Não acontece de a arte imitar a vida, ou vice-versa? Pois é, é o que eu temo.



19 março 2011

Filme "PASSE LIVRE" (2011)

Um filme que tem à frente da direção os irmãos Peter e Bobby Farrelly ("Quem vai ficar com Mary?"; "O amor é cego"; "Ligado em você"; "Débi & Lóide"...), contando com Owen Wilson (“Marley & eu”) e jason sudeikis (“Saturday Night Lives”) como estrelas, o que pode se esperar?
Bom, dos manos diretores, se fosse há alguns anos, eu diria que a possível melhor comédia da atualidade. Já tirando pelos protagonistas, Owen Wilson nunca me convenceu, enquanto Jason, um tanto desconhecido, a não ser por sua atuação no mediano “Saturday Night Lives”, passou-me melhor impressão se comparado ao seu companheiro de filmagens, mesmo sendo Owen veterano.

Esta comédia retrata a vida de dois amigos adultos e casados, donos de uma notável e incômoda libido adolescente. Por tal motivo, os dois recebem de suas respectivas e expectantes esposas a liberação para curtirem uma semana de paqueras descompromissadas no intuito de os dois compreenderem a importância do amadurecimento etário e do envolvimento estrito e sem reservas com suas parceiras.

Filmes assim, lógico, não trazem nenhuma novidade. O foco é o mesmo de sempre, explorar o constrangimento que os astros principais irão passar. Alguns surreais, outros mais críveis, contudo, é somente isto.
A escatologia, os estereótipos, os personagens secundários excêntricos, as situações desconfortáveis em lugares impróprios, é no que se resume “Passe Livre”. É até difícil desviar-se do habitual ao analisar tal película, pois realmente o filme transborda inautenticidade, forçando a barra mesmo, numa tentativa desesperada de arrancar risos fáceis e descerebrados.

Sempre curti filmes cômicos que seguissem uma linha mais sacana, com algumas funcionais e empíricas gags, como os irmãos Farrelly costumavam fazer, e com certo requinte até. Eles atingiam o grau exato de irreverência sem cair no ofensivo. E mesmo que o fizessem, eram justificados pela singularidade. Porém, parece que essa parceria cineástica, que transcende o fraterno, caiu na própria armadilha do enredo de “Passe livre”. Eles atingiram assim a maturidade e agora não entregam mais produções ousadas e eficazes em suas propostas como antes. O que esclarece o resvalo final niquento e piegas da projeção, atitude recorrente nas comédias de hoje.

Durante o decorrer do longa é possível se entreter, rir um bocado, até mesmo se simpatizar pela dupla formada por Owen e Jason, mas ainda não é era o esperado.
Diria que Jason roubou a cena, ainda que me passasse a idéia de caricatura extrema. Owen, por outro lado, prefiro não me aprofundar. Sua inexpressividade, paradoxal a sua esgares, não pode ser perdoada nem mesmo em um filme que não exija tanto de seu desempenho como ator. Ele é estigmaticamente risível no pior dos sentidos.
Mas o que mais me aborreceu em detrimento do elenco, foi ver Christina Applegate, aqui encarnada no tipo “housewife”, tão inerte, sem seu conhecido e profuso timming para o gênero. Quem a viu no saudoso seriado “Married with children”, sabe do que estou falando.

No tocante a parte técnica do filme, os farrelly mantêm o mesmo estilo, sem muitas novidades, mas competentes no que fazem.
É claro que em “Passe livre” há resquícios do que os brothers farrelly tem de melhor, ao julgar pela composição de cada tomada, extraindo ao máximo a comicidade de seus atores, mesmo quando estes não são naturalmente divertidos. O problema é que a fórmula utilizada está agora desgastada, e perambular pelo absurdo para se render a sobriedade familiar final não condiz com o perfil que eles traçaram no início de carreira. Tempos esse em que Jim Carrey foi revelado e Ben Stiller era engraçado.

Voltando-se agora às cenas de "Passe livre", no geral, são demasiadamente impulsivas e embaraçosas, sem contar com o forçado comportamento importuno e púbere da dupla. Parece uma versão alternativa piorada de “Se beber, não case”, apostando em aparentes trintão-quarentões com uma esbulhada postura juvenil, beirando sempre o exagero.

O supramencionado desfecho teria um significado mais persuasivo se a previsível guinada que a trama teria não fosse tão óbvia. E insisto: não combina com os Farrelly comédias que se concluem de forma politicamente correta, por mais bonita e precisa que seja a mensagem.
É uma pena que tantos disparates conferidos em “Passe livre” tinham a única intenção de entregar um fim panfletário.
Jennifer Aniston e Adam Sandler devem estar se sentindo lesados neste momento.


13 março 2011

Filme "DOCE VINGANÇA" (2010)

Violência gratuita sempre foi uma questão objetável pra mim. Não vejo razão, justificativa, nem sequer atrativos. Incomodo-me, sinto repugnância... mais pelos doentes que produzem do que pelo plano de fundo dos filmes propriamente ditos.
Com seu irônico título, “Doce vingança”, o filme aqui em questão, é um dos mais atuais exemplares desse perfil desnecessário de cinema.
Nele, Jennifer é uma escritora que opta por alugar uma casa em um lugar recluso para concluir seu romance, em busca de inspiração. E graças à vida e suas nuances, ela é sexualmente brutalizada por um grupo de moradores adjacentes da região. Como represália, ela cria engenhosas armadilhas para se vingar de cada um.

O filme é um remake do sexploitation “A vingança de Jennifer” de 1978. E ao comparar os dois, posso dizer que é fácil identificar as mutações que sofreu “Doce vingança” no tocante ao original, pois cada projeção foi questionavelmente peculiar em seus propósitos.
No primeiro, lançado a mais de 30 anos, o tema era extremamente polêmico, autêntico e profligado por diversos países devido a sua exacerbada violência e misoginia. A ousadia se encontrava nas cenas de estupro e todo o clima sadomasoquista da situação, inclusive na vingança em si, quando a moça se “aproveitava” dos verdugos.
Já na refilmagem, datada, por sinal, a elaboração está nas armadilhas arquitetadas pela “vítima”, dignas de qualquer “Jogos mortais” da vida, visando somente o lucro sobre as mentes más e vazias que compõem grande parte de nossa civilização hoje; mentes estas que teimam em classificar isso como entretenimento.

Mesmo causando frisson na época e sendo revolucionário por sua audácia, “A vingança de Jennifer” caiu no esquecimento e tornou-se irrelevante para a sétima arte. Seguindo a oportuna retórica, o que dizer então de sua re-produção?
O niilista “Doce vingança” não se salva em nada! Nem mesmo a forte cena de curra sofrida por Jennifer – o estopim do filme –, fundamenta suas ações, afinal, seus feitos se igualam à “monstruosidade” de seus agressores, e ainda tenta dar a insalubre impressão de dever cumprido à anti-heroína.
O crime sexual e a vingança, basicamente o resumo do filme, nem sequer sugerem à narrativa uma silogia, logo, os argumentos também não tem respostas, tornando o filme mais incômodo por seus inúmeros porquês do que pelas cenas fortes.

Por exemplo: como alguém tão suscetível e indefeso, julgando-se assim pela situação, escapou sem sérias sequelas de uma investida tão cruel? Como seu contra-ataque conseguiu ser tão pragmático e rápido? O que motivou aqueles homens a cometerem tal ato? E como eles, com toda aquela hostilidade, tornaram-se - constrangedoramente - presas tão fáceis após mostrarem tanta habilidade para o sadismo?

Em suma, “Doce vingança” é um remake redundantemente “mais do mesmo”, regado de clichês e duvidosos arquétipos, apostando novamente em uma mocinha isolada, lugares ermos, jovens incompreensivelmente violentos, policial arbitrário, câmeras trêmulas com captações pessoais e fechadas, sem contar com todos aqueles “sustos” sem sucesso, sob o pretexto de brindar um “final feliz” após tanto sangue e mutilação.


03 março 2011

Filme "BRUNA SURFISTINHA - O DOCE VENENO DO ESCORPIÃO" (2011)

Raquel, uma jovem com os complexos físicos oriundos da idade púbere, mesmo sendo de uma família estabilizada financeiramente decide-se mudar de vida, o que culmina em sua fuga de casa. Sua decisão agora é tornar-se prostituta, e passa a usar o codinome “Bruna surfistinha”.

Qualquer marmanjo que se preze, já ouviu falar de Bruna Surfistinha. Ela ficou conhecida por relatar seus verídicos episódios sexuais com os clientes por intermédio de um blog. Mas alçou fama mesmo por ter seu diário virtual impresso em livro, o famigerado “O doce veneno do escorpião”, além de ter uma passagem transitória pela carreira pornográfica.
Para a moça isso rendeu entrevistas, participações em programas televisivos populescos, outros títulos publicados derivados de seu primeiro livro, e foi assim que “Raquel Surfistinha” instigou o diretor Marcus Baldini a retratar sua história em um longa.
Eu não tenho dúvidas que o filme será sucesso, afinal, foi bem divulgado, extremamente aguardado, é uma película naturalmente polêmica e posso adiantar que as expectativas não serão abaladas.

Primeiramente, porque o espectador, no caso os homens, que se decide por assisti-lo tem por inicial intenção ver apenas uma coisa: Débora Secco – aqui a protagonista na pele de Bruna – seminua em tórridas cenas de sexo. E verá.
Mais o filme vai além. Eu pressupunha que o filme seria apenas isso, cenas de sexo gratuitas sob o pretexto do tema, mas não. É claro que o filme não é o melhor exemplo do que é ser profundo ou introspectivo, mas ele é sincero.

O tema por si só é difícil de abordar, e na maioria das vezes, os que optam por trabalhar o mesmo transmitem a impressão bifurcada de moralismo ou apologia. Mas aqui nada é desmedido ou transtornado.
O diretor foi, em tese, fiel ao livro, sendo transparente e, por vezes, imparcial, pois o roteiro apresenta a história sem focar nitidamente em julgamentos.
Porém, ainda assim o filme não deixa de ser didático em alguns pontos, pois a narrativa, gradativa e implicitamente, tenta justificar alguns dos, digamos, "desvios de caráter" da personagem.

No filme ela está mais para uma adolescente vingativa, autopunitiva, que tenta conquistar pelo corpo o que lhe foi negado, como: atenção familiar, respeito dos colegas, destaque entre as meninas...
No livro ela é mais complexa, do tipo rebelde sem causa - se comparado a sua família estruturada -, escolhendo a vida libertina simplesmente pela sua simpatia e vaidade inerente ao sexo.
Pode-se até dizer que incoerência entre filme e livro se dá somente em sua essência, mas nada que prejudique a ideia em si, afinal, a descrição das situações pelas quais ela passa, juntamente com a cronologia dos fatos, estão de acordo.

Quanto à sobredita protagonista, Débora Secco, esta foi precisa em sua atuação. Surpreendeu-me até, já que eu nunca a vi como uma atriz destacável.
A princípio, apresentando Raquel adolescente, ela aparenta involuntariamente desconforto e insegurança, mas nada que a comprometa seriamente, diria até que tal fato auxiliou sua representação, afinal, vivenciando uma situação como a da personagem, ela deveria mesmo sentir-se confusa e despreparada.
O único problema quanto à reprodução deste exato período da vida da protagonista se dá no tratamento pouco convincente dado a aparência de Débora. É visível a idade da atriz, ainda mais quando ela interage no colegial. Por outro lado, na fase adulta, eu não consigo ver ninguém mais apropriado que ela para interpretar tal papel. Destaque também para o seu físico que não poderia estar em melhor forma, nem mais exuberante. É elogiável a absorção e dedicação que ela teve com a personificação de Bruna.

Mantendo o foco ainda na performance de Débora Secco, sem dúvida, segundo ela mesma, teve em “Bruna Surfistinha - O veneno do escorpião” seu maior desafio. Na maior parte do tempo ela está intensa, compenetrada, até caricata – o que pode ser conferido nos momentos em que apresenta o vício da personagem por cocaína. Mas são nas cenas de sexo – catálises de toda a metamorfose de Raquel – que Débora precisa transferir ao espectador verossimilhança, ao invés de pura apelação visual. O que também não impede que o filme se descambe em cenas de sexo – para o delírio dos mais sedentos –, o que no caso, não é exatamente negativo. Convenhamos que a história não teria lógica se seguisse pelo recato.

Enfim, o filme termina de forma aceitável, diria até que elegante, somando aí mais um ponto para o cinema nacional que não tem feito feio nos últimos anos.
Eu não poderia ser muito exigente no tocante a parte técnica, até porque a proposta do filme é expor a vida de uma garota de programa que "se regenerou" e alcançou fama. O que se espera de uma história assim, foi visto aqui, com certeza. Só isso é suficiente para prestigiarmos a projeção.


21 janeiro 2011

Filme "ENROLADOS" (2010)

A Disney sempre enalteceu a imagem das figuradas intituladas como “princesas”, tornando-as sonho de consumo entre a maioria das garotinhas, e uma de suas marcas registradas. Ultimamente até mesmo a forma de retratá-las tem sido tão variada, quanto constante, desde o tradicional formato em desenho animado, como visto no recente “A princesa e o sapo” – este inova pelo fato de a princesa ser a primeira representante da raça negra –, a versões live-action, como no chatíssimo “Encantada”.
Agora, como era de se esperar, nos aparece à estória de Rapunzel, diria até que tardiamente, debutando como a primeira princesa em animação CGI.

Como acontece em todo desenho que leva o nome Disney, este é também embalado por uma trilha sonora enfastiada, sob um clima totalmente pueril, contando com a presença de personagens secundários, normalmente animaizinhos exóticos, responsáveis por todas as piadinhas mais do que batidas.
É claro que isso não resume “Enrolados” – o título mais masculino que encontraram para Rapunzel, na tentativa de tornar a estória unissex –; o filme é bom e tem seus momentos, tanto engraçados como romântico. Destaque para a cena do lançamento das lanternas iluminadas ao céu, recheada de brilho e enlevo, tanto visual como climático, por assim dizer.
Mas não posso negar que sinto a saturação rodear o gênero. Quando se trata de Disney então, a lista extensa de princesas e historinhas do tipo, já deu o que tinha que dar.

Tudo bem que a direção de Byron Howard (da também animação “Bolt – o super cão”), compartilhada com o desconhecido Nathan Greno, deu uma repaginada no estilo, na ambientação e na estrutura desse antigo conto de fada, conforme comprova-se aqui, ressaltando a princesa, já não tão ingênua, e o príncipe, sob efeito do bastante utilizado recurso de desmoralização da classe, bem mais interessante que os convencionais... Mas ainda assim, eu não consigo deixar de ver “Enrolados” como um filme bobinho que, logo será apontado como mais um integrante do time das animações-carbono que dão sequência a esse novo perfil, digamos, um tanto "subversivo", de príncipes e princesas. Afinal, esse tipo de ideia alternativa não é tão novidade em animações de estúdios concorrentes, como já vimos, muito bem representados por sinal, em “Shrek” e “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho”. E convenhamos também que, "Enrolados" não tem a mesma intensidade e sagacidade dos sobreditos.

E não tem porquê falar mais sobre isso... Eu sei que o máximo que se dá pra fazer em um filme infantil foi feito aqui, pois estamos falando de um filme que tem como público-alvo, pelo menos nominalmente, as crianças. Ou seja, é o tipo de filme que não se pode esperar muita inovação, pela necessidade que seus infantes espectadores tem de algo que seja facilmente compreensível. Até mesmo as histórias de amor adultas estão seguindo uma linha padronizada e desgastada, seria então covardia esperar mais de uma animação infantil.
O que me incomoda mesmo é o tema. E olha que eu sou um acompanhador assíduo de filmes dessa espécie.
Mas, sem problemas, não vou tornar isso motivo para desqualificar o filme. A qualidade do mesmo está acima da média e marca o retorno da diversão nos filmes Disney, o que há tempos não podia ser conferido. E não posso negar que o casalzinho aqui tem uma química admirável.

Os efeitos tridimensionais estão em perfeita sintonia, apesar de eu não ter gostado muito do aspecto do cabelo da heroína – acho que foram descuidados em alguns momentos com ele deixando-o sintético, sei lá, ainda mais se tratando de um detalhe tão pertinente –, mas o restante está bem desenvolvido e adequado a proposta do longa.
A verdade é que o maior atributo de "Enrolados" se acha mesmo em seu gráfico, como já dito. O cavalo Maximus é super divertido, o camaleão tem suas tiradas, Rapunzel é fofa e o princípe, trocadilhamente falando, encanta (!!), mas o visual realmente é o ponto forte!
Enfim, eu o recomendo, pois é um filme proveitoso, apesar de eu ainda resistir à idéia por se tratar de mais um filme de princesas.